
Como dermatologista, atendo gente de todas as faixas etárias. Há médicos que preferem não atender crianças, mas eu acho bem divertido. Aliás, as frases engraçadas que elas dizem já inspiraram vários livros. Se as coisas transcorrem do jeito certo, a experiência pode não ser tão desagradável para o seu pequeno.
Em primeiro lugar, assim que a criança entra na sala, gosto que ela mesma fale o que aconteceu ou o que sente. Do jeito dela, com as palavras dela. Claro, depois eu vou ouvir o responsável, mãe, pai, quem seja, mas acho bem importante a criança aprender a se expressar, afinal quem sente é ela. Acho também que se ela tem alguma pergunta, deve ser incentivada a fazer. Prometo que respondo.
Segundo: criança apronta. É normal, ora! Você também aprontava. Eu sei que às vezes o seu pequeno pode te tirar do sério, mas tentar corrigí-lo com uma ameaça que no fundo não vai ser cumprida funciona ao contrário. Por isso, por favor, não o ameace dizendo que eu ou outra pessoa da Equipe vamos dar uma injeção, por exemplo. Injeção não é castigo. É uma coisa desagradável, mas que em alguns momentos é necessária. Detesto ver aqueles olhinhos tristes me olhando como se eu fosse um monstro sem coração.
Terceiro: às vezes eu faço procedimentos mais invasivos ou dolorosos numa criança. Por exemplo, uma biópsia de pele. Nestes casos, prefiro não fazer o procedimento no mesmo dia, para que a criança seja preparada em casa pelos seus pais, ou quem cuida dela. O que é esta preparação? Você deve explicar à sua criança o que eu começo a explicar no consultório. Que vamos precisar dar uma anestesia, que ela vai sentir uma pequena picada, mas que depois que a anestesia pegar, ela não vai mais sentir dor. Que aquilo é para o bem dela, que depois vai passar, que ela deve ser forte, enfim! Nestas situações, eu deixo o responsável com a criança o tempo todo para que ela se sinta o mais segura possível. No mínimo segurando a mão. Os menores até operam no colinho. (marmanjo não tem tanta moleza...) Por favor, que venha um responsável que transmita segurança, aquele povo que desmaia quando vê sangue não serve. Sua criança precisa de você. Seja forte e ela também será. Muitas vezes fazemos tudo sem grandes problemas. Chorar porque sentiu dor é perfeitamente normal, até marmanjo chora. Mas eu me recuso a fazer o procedimento em situações nas quais seria preciso conter exageradamente a criança, acho isso um horror! Criança não é bicho. Também não gosto de enganar a criança, tipo esconder o fato de que vou aplicar uma injeção. Faço o melhor que posso para tornar o momento o mais suave possível. Quando nada disso funciona, o que fazer? Melhor levar o procedimento para o hospital, combinar com o anestesista e fazer sob sedação. É mais simples do que parece. E bem melhor do que uma sessão medieval de tortura.
Voltando ao capítulo das promessas. Digo mais uma vez: nunca prometa à sua criança (nem a ninguém, afinal de contas!) uma coisa que você não vai cumprir. Um dia destes uma auxiliar que trabalhava comigo me pediu para tirar um "sinal" das costas de sua filha de 5 anos. A lesão era benigna e eu expliquei que o procedimento era eletivo, ou seja, algo que não tem pressa para acontecer. Expliquei também como ela deveria preparar a menina. Mas... ela escondeu um pequeno detalhe, a injeção. Quando a menina viu a agulha, começou a se debater e eu disse à mãe que daquele jeito não ia rolar, enfim. Mas o melhor veio depois. A mãe prometeu à criança que se ela fizesse a cirurgia, ganharia um chocolate. Ela fez a cirurgia? Não. Ela ganhou o chocolate? Sim. Que tipo de educação é essa?
Nenhum comentário:
Postar um comentário